O oitavo dia

Bem, chegado ao oitavo dia, a estrada tem sido e continuará a ser a minha casa. Começo a sentir-me um pouco estranho, é verdade. Sinto-me um pouco só porque estava habituado a estar sempre cheio de pessoas à minha volta.
Ainda só consegui fazer dois CS (couchsurfing) porque por esta ou aquela razão - sobretudo porque paro muitas vezes para fotografar em sitios maravilhosos como foi hoje o caso do Mónaco e de Nice - não consigo chegar aos meus anfitrães. A experiência de estar por estes lados é muito positiva. Sinto-me um pouco só, é verdade, porque passo muitas horas a conduzir. Mas o poder depois partilhar convosco os textos e a as fotos ajuda a ter espirito positivo. Encontrei um casal francês que já fez muitas viagens de moto.Qando me perguntaram porque fazia eu esta viagem, lembrei-me de lhes resonder que como gostava da filosofia budista e esta nos pretende preparar para a ultima viagem, a maior de todas, quanto mais poder viajar mais preparado estarei. Aliás, este espirito de aventura inato a qualquer ser humano advém do facto - penso eu - de que a nossa alma é uma eterna viajante. Acreditando na reencarnação, sei que o percurso entre viver-morrer e viver de novo implica um crescimento e um amadurecimento que só é conseguido se olharmos a vida de frente. Se fizermos o caminho com convicção. Para mim, esta viagem, também tem este sentido espiritual: fazer o caminho, dar-me ao caminho, ser o caminho.
Viajar deste modo, dependendo de nós próprios em primeiro lugar, dá-nos uma consciência diferente do mundo e do nosso lugar nele. Cada pormenor começa a ganhar uma importância que antes nem me apercebia. O café que me é oferecido, a prostituta de avançada idade que apesar de vestida de mulher tem voz de homem, o Ferrari que passa por mim na estrada.
Hoje foi mais um dia de chuva depois de ontem o sol me ter brindado com a sua presença.
Ontem dormi em Marselha, em CS. Aliás, é caricato mas em Espanha estive num CS alemão e em França num polaco. Em Espanha tive muita dificuldade em arranjar CS e em França, desviei-me do meu percurso para ficar mais tempo no país dos cátaros. Não gostei de Marselha. Apesar de ser uma cidade com muitas coisas bonitas para se ver, o ambiente no centro é muito pesado. À noite vi uma pobreza enorme em homens e mulheres que procuram comida em caixotes do lixo e prostitutas com uma idade muita avançada. Os meus anfitrões quiserem mostrar-me esse lado da cidade para que eu a entendesse melhor. Fiquei a dormir mesmo no centro, num bairro habitado pela comunidade muçulmana. Tive de pagar para guardar a moto num local fechado e tve de me levantar muito cedo porque os meus CS tinham de trabalhar bem cedo no domingo. De manhã, quando pedia o pequeno almoço e o meu francês era insuficiente, a funcionária perguntou-me se era italinao. Tendo respondido que era português logo obtive como resposta: "eu sou filha de portugueses, podes falar comigo em português porque não te entendo no teu francês..."Podem ver nas fotos a beleza dos locais por onde passei. Adorei o Mónaco e nunca mais vou ver o grande prémio de fórmula um da mesma maneira. Era grande fã da fórmula um, antes de começarem a transmitir as corridas em canal duplamente pago, e adorei a experiência de conduzir a minha Gilera nas pistas do Mónaco! Amanhã vou para Milão onde irei ficar dois dias para depois ir passar o dia do meu aniversário com os mecânicos da casa mãe da Gilera, perto de Pisa.